4 de novembro de 2025
A tecnologia usada para combater ataques a drones no RJ
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As imagens de drones controlados por traficantes do Rio de Janeiro lançando explosivos sobre policiais, durante a megaoperação nos complexos da Penha e do Alemão na semana passada representa um salto no poder bélico dos criminosos. Não foi propriamente uma novidade às forças de segurança, que já vinham em alerta para este uso, que reafirmou a necessidade de investir em equipamentos para combater ataques a drone.

Os ataques escancararam uma nova fronteira da criminalidade: a disputa pelo espaço aéreo com facções armadas. A Polícia Civil divulgou imagens que mostram drones sobrevoando policiais e lançando granadas durante os confrontos que mobilizaram 2,5 mil agentes, resultaram em 121 mortos — quatro policiais — e mais de uma centena de presos.

Os drones usados pelos criminosos são versões comerciais, adaptadas com uma espécie de garra mecânica — semelhante às de máquinas de pegar brinquedos — para transportar e soltar explosivos. Com o desbloqueio dos sistemas de segurança, conseguem voar acima das altitudes permitidas e operar em áreas restritas, como as que cercam aeroportos e presídios.

Em resposta a essa ameaça, o governo do Rio de Janeiro anunciou, em setembro, a compra de 80 sistemas antidrones, também conhecidos como fuzis antidrones. Essas armas emitem ondas de rádio capazes de cortar o sinal entre a aeronave e o operador e impedir o ataque a drones. Ao perder comunicação, o drone é forçado a pousar automaticamente ou retornar à base.

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RJ investiu R$ 27 milhões para combater ataques a drones

O governo do Rio de Janeiro fez investimento de R$ 27 milhões nos equipamentos antidrones. O valor integra um pacote tecnológico de segurança de R$ 4,5 bilhões, que inclui câmeras corporais, equipamentos com reconhecimento facial e de leitura automática de placas de veículos.

Os equipamentos serão usados pelas polícias Civil e Militar e pelo efetivo da Secretaria de Administração Penitenciária. O objetivo é neutralizar ataques a drones, contrabando de armas, drogas e celulares, além de tentativas de espionagem e ameaça a autoridades.

Segundo especialistas, esses fuzis, embora não disparem projéteis, têm poder comparável ao de uma arma de guerra no combate aéreo de curta distância. O bloqueio ocorre por radiofrequência, afetando o controle remoto e o sistema de GPS das aeronaves.

Com investimento de R$ 27 milhões, governo do Rio compra 80 sistemas antidrones para neutralizar drones criminosos.Governo do Rio compra 80 sistemas para neutralizar drones criminosos. (Foto: Ricardo Stuckert/Gabinete de Segurança Institucional)

Fuzil antidrones pode custar até R$ 700 mil

Em contrapartida, o crime organizado está de olho no mesmo tipo de tecnologia. Em julho, a Polícia Militar do Rio encontrou um interceptador de drones com o brasão da Ucrânia escondido em uma casa na comunidade do Acari, zona norte da capital. O aparelho, conhecido como Tryzub — ou “tridente ucraniano” —, é de uso militar e tem alcance de até 7 quilômetros.

O equipamento, segundo a PM, estava em funcionamento dentro de um sótão. Os criminosos usavam o interceptador para impedir o uso de drones pela polícia na região. “Possui tecnologia avançada, com capacidade para interferir, neutralizar e até derrubar aeronaves remotamente pilotadas”, informou a corporação à época.

Fuzis antidrones têm poder comparável ao de uma arma de guerra no combate aéreo de curta distância.

A apreensão, feita com apoio da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), levantou suspeitas de que facções estejam contrabandeando dispositivos militares e aprendendo a operar sistemas de guerra eletrônica. De acordo com o especialista em aeronaves remotamente pilotadas Raphael Pustilnick Ribeiro, da empresa RPR Drones, os antidrones são equipamentos restritos para as forças de segurança. Custam entre R$ 200 mil a R$ 700 mil.

“Ao contrário do que muitos pensam, não é um fuzil bélico, ou seja, não atira nenhum projétil contra os drones. Ele se trata de um bloqueador de sinal direcional, com a capacidade de direcionamento de facho do sinal (bloqueador) para o ponto de interesse. O operador desse equipamento precisa apontar o mesmo diretamente para o drone. Por isso que ele tem empunhadora e um corpo no formato de um fuzil, para uma maior precisão de utilização pela equipe”, explica Ribeiro.

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Facções criminosas buscam espaço aéreo como campo de batalha

Em junho, outro episódio chamou atenção: a Polícia Civil apreendeu um fuzil antidrone em uma operação no Complexo de Israel, na zona norte carioca. A ação paralisou por horas o tráfego na Avenida Brasil e afetou o funcionamento de trens e do BRT Transbrasil. Dezessete escolas suspenderam as aulas por causa dos confrontos.

O avanço tecnológico das facções preocupa especialistas em segurança. “Antes, o domínio era dos helicópteros da polícia. Agora, as facções entenderam que também podem usar o espaço aéreo como campo de ataque”, afirma o pesquisador e ex-policial Roberto Uchôa, membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Segundo o especialista em segurança, esses equipamentos são fabricados majoritariamente na China. “E vendidos livremente. Mesmo que se tente restringir, há manuais online para fabricá-los com impressoras 3D”.

Criminosos usam drones adaptados e impressos em 3D

A tecnologia usada nos ataques a drones é simples e acessível. Equipamentos comerciais, que custam de R$ 7 mil a R$ 50 mil, são modificados com acessórios vendidos por cerca de R$ 120, capazes de carregar explosivos. O conjunto completo de lançadores não ultrapassa R$ 250.

Ribeiro explica que modelos intermediários, disponíveis no mercado de usados, têm capacidade de decolar com até 1 kg de carga. Isso seria suficiente para transportar e lançar até três granadas.

“Esses drones têm restrições de fábrica que impedem o voo em áreas sensíveis. Mas os criminosos desbloqueiam o software para operar sem limites e fora do alcance das forças policiais”, explica. O especialista alerta para o risco de o país ingressar em uma “nova era de conflitos urbanos verticais”, com disputas e ataques aéreos frequentes em favelas.

Anac prepara normas para o licenciamento de pilotos e drones

O sistema de Solicitação de Acesso de Aeronaves Remotamente Pilotadas (plataforma Sarpas), do Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea), registrou em 2022 cerca de 310 mil solicitações de voos de drones no Brasil. No ano seguinte, o número saltou para mais de 390 mil, e ultrapassou a marca de 400 mil em 2024.

Neste ano, a projeção indica um novo recorde. Esses dados se referem apenas aos voos regulares autorizados, ou seja, aqueles que seguem as normas do espaço aéreo brasileiro — “sem contar os milhares de voos irregulares que ocorrem diariamente”, aponta Ribeiro.

Para tentar conter o avanço do uso irregular de drones, a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) prepara o novo conjunto de Regulamentos Brasileiros da Aviação Civil (RBAC 100). São normas que vão endurecer o licenciamento de pilotos e aeronaves não tripuladas.

A regra prevê a criação de uma certificação semelhante à de pilotos de aviões, com cursos e provas obrigatórias. A expectativa é aumentar o controle sobre o uso desses equipamentos e responsabilizar operadores irregulares.

Fonte: https://www.gazetadopovo.com.br/brasil/equipamento-antidrones-combate-ataques-drones-por-faccoes-criminosas/