20 de dezembro de 2025
a fortuna escondida dentro de peixe brasileiro
Compartilhe:

Avaliada em até R$ 3 mil o quilo, uma parte “escondida” dentro de um peixe brasileiro se transformou em um produto valioso na pesca nacional e conquistou o mercado exterior. A bexiga natatória — conhecida como grude — é extraída da pescada-amarela e saiu das águas do litoral amazônico para ocupar lugar de destaque na Ásia, onde simboliza prosperidade, longevidade e status social.

A bexiga natatória é o órgão responsável por regular a flutuabilidade dos peixes. No caso da pescada-amarela, ela ganhou valor econômico elevado devido à forte demanda internacional.

No mercado asiático, consumidores utilizam o produto tanto na alimentação quanto na medicina tradicional, incorporando-o a sopas e tonificantes associados ao fortalecimento da pele, dos ossos e das articulações. Rica em colágeno, consumidores na China, no Vietnã e em Hong Kong consideram a grude um “elixir da longevidade”.

VEJA TAMBÉM:

  • A cidade brasileira com as maiores jazidas de ametista do mundo conhecida pelo turismo subterrâneo

Grude agrega valor ao peixe e muda a lógica da pesca

De acordo com o presidente do Sindicato dos Pequenos e Médios Armadores de Pesca dos Estados do Pará e Amapá, Claudio Botelho Cavalcante, a grude é um subproduto do peixe, mas com valor agregado muito superior ao da carne. “O mercado asiático utiliza a grude com várias finalidades, tanto na alimentação quanto em resinas e cosméticos. Ainda é um mistério para nós por que o produto atinge um valor tão alto”, afirma.

Conforme o dirigente sindical, o quilo da grude da pescada-amarela varia atualmente entre R$ 2,5 mil e R$ 3 mil. Outras espécies, como corvina e camurim, também passaram a ter a bexiga natatória comercializada, com preços variados. “Hoje, o impacto chega a quase 50% do valor total da produção do pescado”, ressalta.

Na prática, isso significa que a bexiga natatória pode render mais aos pescadores do que o próprio peixe. O pescador Benjamin Benedito, 36 anos, morador de Porto Rico (MA), relata que chega a comercializar o quilo da grude por R$ 1,5 mil, enquanto o quilo do peixe varia entre R$ 20 e R$ 30. “Depois de secar, ela fica ainda mais valorizada”, disse.

O pescador afirma que acompanha o pai na pesca desde a infância e atua há mais de 15 anos na atividade. Segundo ele, além de ser um produto valorizado para exportação, a pescada-amarela tem forte aceitação no mercado interno. “É um peixe muito consumido no Brasil por ter uma carne saborosa. A grude vai quase toda para exportação, principalmente para a China”, relata.

A bexiga natatória, conhecida como grude, conquistou o mercado asiático.A bexiga natatória, conhecida como grude, conquistou o mercado asiático. (Foto: Benjamim Benedito/Arquivo Pessoal)

VEJA TAMBÉM:

  • A rua considerada uma das mais bonitas do mundo chama a atenção por seu túnel verde de árvores.

    A rua brasileira considerada uma das mais bonitas do mundo

Mercado asiático domina a cadeia da bexiga natatória

De acordo com o presidente do sindicato, os compradores chineses já dominaram a cadeia produtiva e passaram a negociar diretamente com os trabalhadores. “Hoje, os chineses vão direto nos barcos para negociar com os pescadores. Muitos atuam a serviço dos próprios compradores da China”, explica Cavalcante. A produção se concentra principalmente nos estados do Pará e do Amapá, que lideram a captura da pescada-amarela.

Conforme os dados do Ministério da Pesca e Aquicultura (MPA), em 2024 as exportações de grude somaram 628,4 toneladas, movimentando US$ 21,2 milhões.

Normas gerais regulam a pesca e o comércio enfrenta limitações

Segundo a diretora do Departamento de Pesca Industrial, Amadora e Esportiva do MPA, Sandra Silvestre, os estoques da pescada-amarela apresentam sinais de sobrepesca. Dados do projeto de Avaliação Ecossistêmica dos Recursos Pesqueiros Demersais e Pelágicos das Costas Norte e Nordeste (Repensapesca) indicam que a biomassa da espécie está abaixo do nível considerado seguro, com retirada de peixes em ritmo maior do que a capacidade natural de reposição.

A diretora explica que não há regras específicas exclusivas para a pescada-amarela. A espécie é capturada por modalidades como redes de emalhe e de arrasto, que possuem regulamentações próprias. “No caso do emalhe, está proibida a entrada de novas embarcações na frota, e as redes de fundo têm altura máxima permitida de 20 metros. Também há áreas de exclusão de pesca, como em Unidades de Conservação.”

O comércio da bexiga natatória não é ilegal no Brasil, mas há restrições quanto à exportação. De acordo com Silvestre, a venda da bexiga natatória seca para fins alimentícios só é permitida quando o processo de secagem é realizado pela própria indústria.

Ela comenta que não existe um programa específico e completo de rastreabilidade para acompanhar toda a cadeia produtiva da pescada-amarela, do desembarque ao comércio final. “A espécie, no entanto, é monitorada por instrumentos existentes de ordenamento pesqueiro, como o uso obrigatório de rastreamento por satélite e o envio de mapas de bordo em determinadas frotas”, acrescenta.

Fonte: https://www.gazetadopovo.com.br/brasil/iguaria-escondida-dentro-de-peixe-brasileiro-que-conquistou-o-mercado-da-asia/