30 de outubro de 2025
Inadimplência no Paraná é maior entre estados do Sul
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O Paraná vive um paradoxo econômico: mesmo com desemprego baixo e atividade estável, o endividamento das famílias avança acima da média nacional. De 2024 para 2025, o valor médio das dívidas de pessoas físicas cresceu 19% no estado, frente a 16% no Brasil. Entre empresas, o salto foi de 17,5%, também acima da média nacional de 13,4%.

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No estado, 43,51% da população adulta está inadimplente, índice menor que o total do Brasil (48,31%) mas superior ao registrado em Santa Catarina (38,11%) e no Rio Grande do Sul (41,49%). Segundo o presidente da Associação Nacional dos Bureaus de Crédito (ANBC), Elias Sfeir, que participou de um congresso empresarial na cidade de Foz do Iguaçu (PR), o problema tem múltiplas causas, mas uma delas está no próprio sistema de proteção ao crédito.

“No Paraná, o consumidor só é negativado após 30 dias de atraso. Nos outros estados do Sul, o credor pode negativar em dois dias. Esse intervalo maior acaba funcionando como um incentivo para que a pessoa siga comprando, acreditando que ainda está tudo bem — quando, na verdade, já ultrapassou o limite”, compara.

A Lei 22.130/2024, que entrou em vigor em abril deste ano, exige período mínimo de 30 dias para negativação do cliente no estado. Para Sfeir, o avanço do endividamento reflete a baixa educação financeira do brasileiro. “A falta de conhecimento sobre o funcionamento do crédito é o maior problema. As pessoas confundem crédito com renda. Crédito não é direito, nem ganho: ele consome a renda. O benefício é imediato, mas o compromisso é de médio prazo — e poucos conseguem enxergar isso.”

Segundo dados da ANBC, 40% de todas as dívidas registradas em 2025 são de natureza financeira. No país, há mais de 70 milhões de pessoas negativadas. Metade da população, de acordo com pesquisas citadas por Sfeir, apresenta saúde financeira considerada ruim ou muito ruim.

“A sustentabilidade do crédito depende de três pilares: visibilidade, crédito responsável e consumo consciente. Mas o terceiro pilar, a educação financeira, ainda é o mais frágil”, afirma. Ele lembra que a educação financeira deveria começar ainda na infância, nas escolas, e precisa ser reforçada em casa.

“Antigamente existia a disciplina de economia doméstica. Hoje, a gente precisaria retomar isso. É como o uso do cinto de segurança: começou com as crianças aprendendo na escola e ensinando os pais. A mudança de comportamento pode vir do mesmo jeito.”

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Apostas online preocupam setor de crédito

O impacto das apostas online (as chamadas bets) sobre a saúde financeira da população também preocupa o setor de crédito. “As bets têm um efeito devastador. Uma pesquisa no México mostrou que quem tem três ou mais cadastros ativos em sites de apostas tem 80% mais chance de se tornar inadimplente. É uma epidemia financeira”, alerta Sfeir.

Segundo ele, a digitalização ampliou o alcance de um vício antigo. “O jogo sempre existiu, mas a internet o transformou em um problema de massa. Há pessoas que ganham um salário mínimo e perdem parte dele apostando, acreditando que vão resolver a vida. É uma ilusão. Ninguém entra num cassino para salvar o patrimônio. As bets vendem esperança rápida e geram frustração e dívida.”

Apesar da má fama, Sfeir defende que a negativação tem papel pedagógico e protetor. “Quando a pessoa recebe o aviso de negativação, 35% delas vão lá e pagam porque tinham esquecido. Outras negociam. E, no caso dos consumidores compulsivos — cerca de 10% dos negativados —, negar crédito é o melhor que se pode fazer, porque evita que a dívida destrua a pessoa e a família”, diz.

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Setor trabalha por uma relação mais consciente com o endividamento

Nos últimos anos, o setor de crédito vem tentando incentivar uma relação mais consciente com o endividamento. O “Cadastro Positivo”, criado há cinco anos, é um exemplo: 78% das notas de crédito das pessoas físicas melhoraram desde sua implementação.

“Qualquer consumidor pode consultar sua nota de crédito gratuitamente e entender por que ela está baixa e o que pode fazer para melhorá-la. Entre os que seguem as recomendações, 82% conseguem subir a pontuação”, afirma o presidente da ANBC.

Com a aproximação das festas de fim de ano, a tendência é que o crédito volte a se expandir — e o endividamento também. “O consumo é o motor da economia, mas também é emocional. No Natal, as pessoas se endividam para demonstrar afeto, e esquecem que carinho não precisa de crédito. Às vezes, o melhor presente é a presença”, resume Elias Sfeir.

Enquanto o Brasil tenta equilibrar a retomada econômica e o alto custo de vida, o caso do Paraná serve de alerta: o prazo de 30 dias para negativação, aliado à baixa educação financeira e à expansão das apostas digitais, forma um terreno fértil para o superendividamento. E, como lembra Sfeir, “o crédito, quando mal usado, deixa de ser solução e vira armadilha”.

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Fonte: https://www.gazetadopovo.com.br/parana/inadimplencia-pr-menor-que-media-nacional-maior-entre-estados-do-sul-credito/