A Polícia Civil do Rio de Janeiro vai investigar alegados moradores do Complexo da Penha, na zona norte da capital fluminense, por suspeita de terem retirado roupas camufladas e possivelmente forjado ferimentos falsos a faca em cadáveres de criminosos que morreram em confronto com a polícia em uma megaoperação na quinta-feira (28). O objetivo seria dar a impressão de que a polícia teria cometido abusos contra moradores, quando na verdade os corpos em questão eram de criminosos que atacaram as forças de segurança com fuzis e granadas.
A maior parte dos confrontos entre policiais e criminosos ocorreu em uma área de mata no alto das favelas conhecida como Vacaria. Desde o início da madrugada, pessoas ainda não identificadas – não se sabe se moradores ou membros do Comando Vermelho – começaram a retirar cadáveres do matagal e enfileirá-los para exposição pública na Praça São Lucas, no Complexo da Penha. O motivo alegado era que familiares poderiam reconhecer os corpos, embora o procedimento padrão fosse aguardar a retirada dos mortos por agentes de segurança ou do Instituto Médico Legal. O reconhecimento oficial ocorre no necrotério do órgão.
A imagem chocante da fileira de dezenas corpos estendidos na praça foi divulgada pela imprensa nacional e internacional. Ao mesmo tempo, começaram a circular boatos atribuídos a supostos ativistas de direitos humanos de que os corpos teriam ferimentos a faca, o que poderia ser um sinal de execução.
No início da manhã, forças de segurança chegaram ao local onde os corpos estavam em exibição.
A cúpula da polícia então convocou uma entrevista para mostrar vídeos onde os mortos enfileirados apareciam em momentos anteriores usando roupas camufladas e coletes à prova de balas.
“Esses indivíduos estavam na mata, equipados com roupas camufladas, coletes e armamentos. Agora, muitos deles surgem apenas de cueca ou short, sem qualquer equipamento — como se tivessem atravessado um portal e trocado de roupa. Temos imagens que mostram pessoas retirando esses criminosos da mata e os colocando em vias públicas, despindo-os”, declarou o secretário de Polícia Civil, Felipe Curi.
“Eu não me surpreenderia se eles aparecessem com lesões a faca para incriminar os policiais”, disse o secretário.
A 22ª Delegacia de Polícia (Penha) instaurou um inquérito para apurar a participação de moradores na remoção dos corpos e na retirada das roupas táticas usadas pelos criminosos. Segundo Curi, a exposição dos cadáveres em praça pública distorceu o trabalho das forças de segurança e será investigada como possível tentativa de manipulação de provas.
Moradores da Penha afirmaram ter encontrado mais de 70 corpos desde a madrugada desta quarta-feira em uma área de mata na Serra da Misericórdia, um dia após a operação mais letal da história do estado. A polícia divulgou nesta quarta-feira (29) a informação que o total de mortos subiu de 64 para 119.
O coronel Marcelo de Menezes Nogueira, secretário da Polícia Militar do Rio de Janeiro, confirmou que os corpos levados pelos moradores não estavam contabilizados no balanço oficial da operação. “A gente observa a retirada das roupas táticas dos corpos por pessoas que estavam acompanhando. Vemos a retirada de um coturno de uma das vítimas”, afirmou o coronel.
Em entrevista coletiva, Felipe Curi atualizou o número de mortos e de apreensões. Segundo ele, foram 58 mortes confirmadas na terça-feira e outras 61 nesta quarta, totalizando 119 mortos, incluindo quatro policiais. Os demais 115 eram “narcoterroristas”, de acordo com o secretário. “Nos boletins de ocorrência, a polícia está classificando os mortos como ‘opositores’, ou seja, criminosos que cometeram tentativa de homicídio contra nossos agentes. Nossos policiais são tratados como vítimas, e os mortos, como autores dos crimes”, disse Curi.
O balanço oficial também indica 113 presos, sendo 33 de outros estados, além de 10 menores infratores. As forças de segurança apreenderam 91 fuzis, 26 pistolas, um revólver e toneladas de drogas ainda em fase de contagem.
Batizada de Operação Contenção, a ação foi planejada ao longo de dois meses e ocorreu após um ano de investigações. O objetivo era cumprir 100 mandados de prisão contra líderes do Comando Vermelho do Rio e do Pará, que estariam escondidos nas comunidades. Segundo a polícia, 81 mandados foram cumpridos. Durante o confronto, criminosos reagiram com fuzis e chegaram a lançar granadas por meio de drones, mergulhando o Rio de Janeiro em um cenário de guerra urbana.
A maioria das mortes de criminosos teria ocorido em confrontos na mata da Vacaria. A estratégia usada pela polícia foi invadir o complexo de favelas por suas regiões mais baixas. Os criminosos do Comando Vermelho teriam então recuado para o ato do morro, onde policiais do Bope (Batalhão de Operações Especiais) estavam montando guarda. Suspeitos que decidiram se entregar foram presos e levados para delegacias, segundo Menezes Nogueira. Outros acabaram baleados em confronto.
Fonte: https://www.gazetadopovo.com.br/republica/moradores-retiram-roupas-camufladas-de-criminosos-antes-de-exibir-corpos-em-praca-e-culpar-policia/
