
A grande maioria dos brasileiros defende o fim dos chamados supersalários no serviço público, segundo nova pesquisa encomendada pelo Movimento Pessoas à Frente ao instituto Datafolha. O levantamento revela que 83% dos entrevistados são favoráveis à revisão das brechas que permitem que servidores ultrapassem o teto constitucional de R$ 46,4 mil mensais, valor correspondente ao salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal.
Esses pagamentos acima do limite são possíveis por meio de “penduricalhos” — benefícios e vantagens eventuais classificados como verbas indenizatórias, que não entram na conta do teto. Entre eles, estão auxílios como moradia, creche, alimentação, gratificações por acumulação de funções e indenizações diversas.
De acordo com o Movimento Pessoas à Frente, os supersalários estão concentrados em uma minoria poderosa do funcionalismo. Dados da entidade apontam que 93% dos magistrados e 91,5% dos membros do Ministério Público recebem remunerações que ultrapassam o teto.
Proposta busca disciplinar exceções
Em resposta à pressão popular e ao elevado custo desses pagamentos, a deputada federal Tabata Amaral (sem partido-SP) apresentou uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para limitar as exceções ao teto salarial. O texto, que está disponível para a coleta de assinaturas no sistema da Câmara, busca definir com mais rigor quais pagamentos podem ser classificados como indenizatórios.
A proposta reconhece auxílios como alimentação, transporte em serviço, férias não gozadas e ajuda de custo em viagens de trabalho. Contudo, impõe condições para pagamentos mais polêmicos, como o auxílio-moradia — que só poderá ser concedido na ausência de imóvel funcional e se o servidor não residir com outra pessoa que também receba o mesmo benefício.
“Os supersalários são pagos a uma minoria do funcionalismo público, aproximadamente 0,06% dos servidores se beneficia dessas brechas, porém, geram um impacto grande aos cofres públicos, que em 2023 foi R$ 11,1 bilhões”, afirma Jessika Moreira, diretora-executiva do Movimento Pessoas à Frente. “A ideia é resgatar a autoridade do teto constitucional”, completa.
Segundo ela, o projeto também prevê punição por improbidade administrativa no caso de descumprimento da norma, especialmente para criação de novas verbas por meio de atos infralegais.
Judiciário lidera os excessos
Entre os principais alvos da crítica pública estão os tribunais. Luciana Zaffalon, diretora-executiva do Justa — centro de pesquisa sobre economia política da Justiça —, ressalta que “a capacidade das instituições de Justiça para burlar o teto é incalculável”. Segundo ela, os supersalários se consolidaram no sistema Judiciário porque é o setor com menor controle externo.
“Ou somos claros e criamos uma regra que não pode ser flexibilizada ou não veremos resultado”, afirma Zaffalon. Para ela, o apoio popular à revisão mostra que a sociedade “enxerga o que tem de concreto nos supersalários, que é a criação de uma casta alheia à realidade nacional”.
Ainda segundo a pesquisadora, os pagamentos excessivos acabam distorcendo a atuação das instituições: “Essa atração de recursos muitas vezes serve para neutralizar as funções que as instituições deveriam exercer, como a responsabilização de gestores públicos e o julgamento de conflitos. Quem processa e define os conflitos tem sido privilegiado: quem pode mais, fica com mais, mas o interesse público nem sempre é priorizado.”
Supersalários na mira da reforma administrativa
O debate sobre os limites da remuneração no funcionalismo ganhou novo impulso com a conclusão do grupo de trabalho da reforma administrativa na Câmara, no início desta semana. Segundo o relator, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), 17 das 66 propostas redigidas pelo colegiado tratam diretamente da regulamentação do teto e dos pagamentos extras.
Apesar de a discussão sobre a reforma ainda não ter data para ir ao plenário, cresce a pressão sobre o Congresso para agir diante do clamor social por mais equidade no serviço público.
A pesquisa Datafolha foi realizada entre os dias 10 e 14 de julho e ouviu brasileiros de diferentes regiões e faixas de renda. A margem de erro é de dois pontos percentuais, com nível de confiança de 95%.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/pesquisa-datafolha-mostra-que-83-da-populacao-quer-o-fim-dos-supersalarios-no-servico-publico/