A venda e a posterior operação para trazer de volta ao Brasil as joias sauditas comercializadas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) tiveram tentativas de esconder o esquema e trapalhadas que ajudaram a Polícia Federal a avançar nas investigações.
Segundo a PF, ex-auxiliares de Bolsonaro foram ao exterior para resgatar as joias. A atitude foi tomada após o caso ganhar repercussão na imprensa e o Tribunal de Contas da União (TCU) determinar a devolução dos objetos ao acervo da Presidência da República.
Mensagens analisadas pela PF mostram que Bolsonaro e seu entorno tinham receio de que a venda das joias fosse descoberta. O grupo temia implicações legais devido à apropriação dos objetos por parte do ex-presidente e queria esconder os indícios de que eles haviam sido levados ao exterior e vendidos posteriormente. As informações constam do relatório final do inquérito da PF sobre as joias, tornado público nesta segunda-feira (8).
Ladrões de joias trapalhões
Trapalhão nº 1: o ex-ajudante de ordens
A Polícia Federal identificou que o tenente-coronel Mauro Cid excluiu mensagens de WhatsApp que havia trocado com Marcelo Câmara, ex-assessor de Bolsonaro, sobre a recuperação do chamado “kit ouro branco”. O conjunto é formado por um anel, abotoaduras, um rosário islâmico e um relógio da marca Rolex, entregue a Bolsonaro em uma visita oficial à Arábia Saudita em 2019.
Apesar de ter excluído as mensagens, o tenente-coronel deixou rastros, pois tinha enviado o mesmo conteúdo para uma outra conta pessoal no aplicativo. A PF descobriu as mensagens e percebeu que se tratavam de fotos do kit ouro branco e dos certificados de autenticidade das joias. “O cuidado em excluir as fotos do chat privado demonstra que os investigados não queriam deixar rastros sobre o motivo da conversa”, diz trecho do relatório da PF.
Mensagem trocada entre Cid e Câmara revelam medo de esquema ser descoberto. “O problema é que essa matéria está falando que se o TCU quiser ir lá vai encontrar e não vai”, diz Câmara mostrando preocupação com uma possível auditoria do TCU no armazém onde estaria o acervo privado do ex-presidente, incluindo as joias sauditas. “Essa mensagem demonstra a preocupação que os investigados tinham, pois os bens de alto valor, ao contrário do que estava sendo dito, não estavam no Brasil”, afirmam os investigadores.
Trapalhão nº 2: o general que fez selfie
O pai de Mauro Cid, general Mauro Cesar Lourena Cid, fotografou a própria participação no esquema: seu reflexo aparece em uma foto de esculturas de uma árvore e de um barco dourados que estavam sendo negociados nos Estados Unidos.
Trapalhão nº 3: o advogado
Já o advogado de Bolsonaro tentou se esconder atrás de um poste para não ser identificado em terras estadunidenses. Frederick Wassef foi até a Flórida, nos EUA, para comprar de volta um Rolex vendido pelo ex-presidente e trazer de volta ao Brasil para devolvê-lo ao TCU.
O advogado se encontrou com Bolsonaro nos EUA e desabafou em áudio para a namorada sobre o assédio de seguidores dele. “Era assim: um bolinho de gente lá tirando foto com ele, outro bolo igual tirando foto comigo, foi a coisa mais louca que eu vi na minha vida, cara. Isso do… isso porque eu tava do outro lado da calçada. De escondidinho, atrás de um poste pra não ser visto, mas não teve jeito. Puta que pariu! Fodeu!”, disse.
Wassef pediu assento escondido no voo aos EUA para não ser identificado. “Eu quero ficar colado. Cabeça, minha cabeça colada na fuselagem, deu pra entender? Ou seja, o banco, ele tem que tá… ele tem que tá deitado assim: com a cabeça apoiada no banco e na fuselagem, na parede do avião, olhando pra janelinha. É bem o contrário. Por favor! Porque, senão, aqueles banco é (sic) uma porcaria, tua cabeça fica no corredor, todo mundo passa, esbarra, olha pra tua cara e eu não posso, cara. Eu sou público, eu tenho que tá escondidinho ali”, disse em mensagem de texto para a atendente de uma agência de viagens, segundo relatório da PF.
Conclusões da PF
Segundo a PF, ex-auxiliares de Bolsonaro venderam os presentes oficiais e entregaram o dinheiro em espécie para o ex-presidente. O relatório final da PF tem 476 páginas e é assinado pelo delegado responsável pelo caso, Fabio Shor.
O total das joias investigadas no caso chega a US$ 1.227.725,12 ou R$ 6.826.151,661, segundo a PF. O valor não considera os bens ainda pendentes de perícia, além das esculturas douradas de um barco e uma árvore e um relógio Patek Philippe, que foram vendidos. A investigação diz que a associação criminosa envolvendo o ex-presidente e auxiliares tentou “legalizar” a incorporação dos bens para poder vendê-los, o que indicaria crime de lavagem de dinheiro. O relatório não informa, porém, qual fatia deste valor teria ficado com Bolsonaro.
Conclusão é a mais dura acusação contra o ex-presidente até o momento. O caso seguiu nesta segunda-feira para análise do procurador-geral da República, que terá 15 dias para se manifestar. É o primeiro inquérito no qual a PF afirma que Bolsonaro teria recebido dinheiro em espécie desviado dos cofres públicos, já que os presentes eram considerados bens do Estado brasileiro.
Com informações do UOL.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/resgate-das-joias-vendidas-nos-eua-teve-trapalhada-de-cid-e-wassef-se-escondendo-atras-de-poste/