1 de dezembro de 2025
Roraima vive terror imposto por venezuelanos do Tren de Aragua
Compartilhe:

Com dezenas de assassinatos brutais em pleno dia, torturas, esquartejamentos, domínio de prisões e até um cemitério clandestino na capital Boa Vista, o grupo criminoso venezuelano Tren de Aragua tem espalhado terror e se consolida como uma das principais facções criminosas instaladas em Roraima. O estado fronteiriço da região Norte é assolado pelo crime organizado, com 13 de seus 15 municípios dominados por facções. Além do Tren de Aragua, o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho (CV) estão entre as facções que controlam o estado brasileiro, que possui o menor número de cidades.

Segundo a 4ª edição do estudo “Cartografias da Violência na Amazônia”, os municípios com presença de facções são: Alto Alegre, Amajari, Bonfim, Cantá, Caracaraí, Caroebe, Iracema, Mucajaí, Normandia, Pacaraima, Rorainópolis, Uiramutã e Boa Vista. São Luiz e São João da Baliza não registram presença confirmada de facções. O estudo foi produzido pelo Fórum de Segurança Pública em parceria com os institutos Clima e Sociedade, Itausa, Mãe Crioula e Laboratório Interpretativo Laiv.

Relatório de inteligência da Polícia Civil de Roraima aponta que integrantes do Tren de Aragua disputam o controle do tráfico de drogas com outros grupos venezuelanos e brasileiros em diferentes áreas da capital Boa Vista, o que tem gerado uma explosão de homicídios e tentativas de assassinato nos últimos anos.

De janeiro até o início de outubro deste ano, mais de 50 migrantes foram vítimas dos dois tipos de crime — de 1º de janeiro até 10 de outubro, o estado registrou 39 homicídios, conforme o relatório. Dessas vítimas, 21 eram venezuelanas, entre homens e mulheres, o que representa 53,8% do total. As outras 18 (46,1%) eram brasileiras. No mesmo período, ocorreram 66 tentativas de homicídio. Entre os alvos, 34 eram brasileiros e 32 venezuelanos.

Em Boa Vista, segundo a Polícia Civil, o Tren de Aragua já domina o tráfico nos bairros de Tancredo Neves, Buritis, Caimbé, Liberdade e Asa Branca e nos acampamentos montados pela operação Acolhida – ação do governo federal que, desde 2018, auxilia refugiados e migrantes venezuelanos em solo brasileiro – próximo à rodoviária da cidade.  

Na semana passada, um chefe da facção venezuelana foi preso em Manaus na terceira fase da operação Afluência, que investiga uma série de assassinatos vinculados a uma facção venezuelana na zona oeste de Boa Vista. Segundo a investigação, o grupo é responsável por mais de 10 homicídios motivados pela disputa por pontos de venda de drogas na capital. Até o momento, seis pessoas já foram presas e materiais como drogas e armas foram apreendidos como parte das investigações. A polícia informou que outros suspeitos seguem procurados. Todos os investigados são venezuelanos. 

VEJA TAMBÉM:

  • Facções disputam o poder do crime organizado na Amazônia

Crise humanitária na Venezuela favorece expansão do Tren de Aragua

A imigração decorrente do caos social e político provocado pelo governo do ditador Nicolás Maduro obrigou os venezuelanos a buscarem ajuda e refúgio longe de casa, tendo Roraima, que faz fronteira com a Venezuela, como um dos principais destinos junto com a Colômbia. Com a chegada de milhares de imigrantes do país vizinho, o governo federal criou a operação Acolhida. Neste contexto, integrantes do Tren de Aragua começaram a chegar pelo menos desde 2016.

A influência do grupo em Roraima cresceu conforme aumentava o fluxo de venezuelanos na fronteira. Entre 2015 e 2019, foram registrados 178 mil pedidos de refúgio ou residência temporária no Brasil. Com o agravamento da crise econômica na Venezuela, esse deslocamento se tornou mais intenso. Roraima teve, em 2022, o maior crescimento populacional do país, mas ainda é o estado menos populoso de todos: tem 637 mil habitantes, segundo o IBGE.

Dados oficiais mostram que os assassinatos saltaram de 90, em 2020, para 127, no ano seguinte em Roraima, quando a facção conquistou pontos de droga na capital para vender cocaína trazida da Venezuela. Entre março e agosto de 2021, a polícia atribuiu doze assassinatos em Boa Vista ao Tren de Aragua. Em quatro, as vítimas foram esquartejadas e seus corpos abandonados em vias públicas. Boa Vista terminou aquele ano como a quinta capital brasileira com maior índice de mortes violentas – 35 por 100 mil habitantes.

Em janeiro deste ano, a Polícia Civil de Roraima localizou um cemitério clandestino atribuído à facção da Venezuela em Boa Vista, no qual foram encontrados nove corpos. O local ficava em uma área de mata entre os bairros Pricumã e Cinturão Verde, na zona Oeste de Boa Vista. Entre as vítimas encontradas havia um homem esquartejado, ossadas, corpos em avançado estado de decomposição e duas mulheres enterradas abraçadas na mesma cova. 

VEJA TAMBÉM:

  • PCC age sobre zona de prostituição no Jardim Itatinga, em Campinas.

    PCC atua em zonas de prostituição com golpes e extorsões

PCC mantém hegemonia no estado de Roraima

Apesar da expansão do grupo criminoso da Venezuela, o PCC ainda se mantém como o grupo hegemônico, atuando em todos os 13 municípios afetados pelo crime organizado em Roraima, sendo exclusivo em cinco deles. Nos outros oito municípios, o PCC divide e, por vezes, disputa territórios com o Comando Vermelho e com grupos de origem venezuelana, com destaque para o Tren de Aragua.

Já o Comando Vermelho está presente em oito municípios de Roraima, mantendo hegemonia nos municípios de Amajari, Cantá, Caroebe, Normandia e Uiramutã. Em relação aos grupos venezuelanos, há múltiplos indícios de atuação, embora a maior visibilidade pública recaia sobre o Tren de Aragua. Apesar disso, ainda são limitadas as evidências robustas que confirmem sua estruturação formal no estado – estima-se sua presença em ao menos três municípios roraimenses. 

“Na faixa de fronteira, há indícios de que o Tren de Aragua funcione como um braço do ‘Sistema’, como os interlocutores autointitulam esta rede criminal transnacional que articula diferentes grupos venezuelanos envolvidos nos fluxos ilícitos de combustível, ouro, drogas e armas provenientes da Venezuela e, em alguns casos, também da República da Guiana”, afirma o estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

O crime organizado também passou a dominar parte do setor mineral da Guiana, com atuação tanto do PCC quanto de grupos criminosos venezuelanos nos garimpos localizados no território guianense.

“Não se descarta que essas redes estejam igualmente vinculadas a esquemas de lavagem do ouro ilegal extraído no Brasil. Há fortes indícios, segundo demonstraram agentes de segurança pública, de que o município indígena de Uiramutã, situado próximo ao marco da tríplice fronteira, funciona como um elo logístico estratégico nas dinâmicas transfronteiriças”, completa o estudo.

De forma semelhante, o município de Pacaraima, principal ligação do Brasil com a Venezuela, cumpre papel central como corredor logístico para o desvio de combustível, equipamentos e outros insumos que seguem por rotas ilegais cruzando a fronteira, com destino às áreas de mineração do lado venezuelano.

VEJA TAMBÉM:

  • A maconha colombiana é considerada de melhor qualidade, mais forte e mais cara que a maconha paraguaia, que tradicionalmente abastece a maior parte do Brasil.

    “Maconha gourmet” colombiana segue rota da cocaína pelo Amazonas e abastece o Brasil

Tren de Aragua na mira de Trump 

O Tren de Aragua ganhou holofotes internacionais desde o começo do segundo mandato presidencial de Donald Trump, nos Estados Unidos. Isso porque embarcações com drogas originárias da Venezuela se tornaram alvo do governo americano, que passou a classificá-las como narcotraficantes.

O principal líder do Trem de Aragua seria Héctor Rustherford Guerrero Flores, conhecido como “Niño Guerrero”. O chefe da facção esteve preso de 2010 a 2012 e de 2015 a 2023. Guerrero é considerado foragido após fugas das prisões no país vizinho. Ele foi julgado e condenado pelo Tribunal Supremo de Justiça da Venezuela a 17 anos de prisão por homicídio, tráfico de drogas, roubos, porte ilegal de arma de fogo e falsidade ideológica.

Hoje, o Tren de Aragua é considerado o maior grupo criminoso da Venezuela e há registros de sua presença na Colômbia, Bolívia, Equador, Peru e Estados Unidos, entre outros países além do Brasil. A suspeita é que o grupo teve origem no ano de 2005 em um sindicato de trabalhadores ferroviários que participavam da construção de uma linha férrea entre os estados venezuelanos de Aragua e Carabobo.

Fonte: https://www.gazetadopovo.com.br/brasil/roraima-vive-terror-imposto-venezuelanos-tren-de-aragua/