O Senado adiou novamente nesta terça-feira (3) a votação do projeto de lei que visa reduzir o prazo de inelegibilidade estabelecido pela Lei da Ficha Limpa. A votação, que estava marcada para esta quarta-feira, foi cancelada após início dos debates e pedidos de senadores e do relator. O projeto deverá retornar ao plenário somente após as eleições municipais.
O projeto, relatado pelo senador Weverton Rocha (PDT-MA), propõe que o período de inelegibilidade permaneça em oito anos, mas que comece a contar a partir da condenação e não mais após o cumprimento da pena. Isso diminuiria o tempo em que candidatos ficariam afastados das urnas. O texto foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado há duas semanas, recebendo apoio de senadores de diversos partidos, desde o bolsonarista Izalci Lucas (PL-DF) até o petista Rogério Carvalho (SE).
Atualmente, políticos condenados por crimes comuns ficam inelegíveis durante o cumprimento da pena e por mais oito anos após o término dela. O projeto também limita a 12 anos o prazo máximo de inelegibilidade, mesmo em casos de múltiplas condenações.
A votação no plenário estava inicialmente agendada para a semana passada, mas foi adiada para esta semana, que tem sessões concentradas na Casa Legislativa. O senador Fabiano Contarato (PT-ES) se posicionou contra a proposta, afirmando que qualquer alteração na Lei da Ficha Limpa violaria o princípio da moralidade, e destacou que a constitucionalidade da lei já foi confirmada pelo Supremo Tribunal Federal.
Por outro lado, o senador Carlos Portinho (PL-RJ) expressou resistência à mudança, mas argumentou que o projeto busca corrigir abusos do Poder Judiciário que, segundo ele, não têm respeitado a vontade original da população e dos legisladores.
Se aprovado sem alterações pelo Senado, o projeto seguirá para sanção ou veto presidencial.
O relator Weverton Rocha manteve o texto aprovado pela Câmara e só fez ajustes de redação, sem alterar o mérito.
“A legislação de vigência enseja, portanto, períodos diferentes de inelegibilidade, a depender do momento da perda do mandato. Pode ocorrer de um parlamentar cassado pela respectiva Casa Legislativa tornar-se por isso inelegível durante o prazo de 8 anos ou até mesmo por 15 anos, a depender do caso”, justifica Weverton em seu relatório.
O projeto é criticado por setores da sociedade. As organizações Não Aceito Corrupção, Transparência Internacional Brasil, Associação Fiquem Sabendo, Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral , Transparência Partidária e Pacto pela Democracia divulgaram uma nota em que criticam o projeto e dizem que ele não foi debatido de forma suficiente.
“Em sentido diametralmente oposto à aprovação da Lei da Ficha Limpa, a sociedade civil foi absoluta e indevidamente alijada do processo de construção do PLP 191/23, não tendo havido debate público em relação a tema de tamanha relevância e que implica em enfraquecimento do projeto originalmente apresentado por iniciativa popular”, diz a nota.
A iniciativa também aumenta de quatro para seis meses antes das eleições o período de desincompatibilização, ou seja, o afastamento do cargo, para candidatos que sejam “membros do Ministério Público, da Defensoria Pública, das autoridades policiais, civis e militares e daqueles que tenham ocupado cargo ou função de direção, administração ou representação em entidades representativas de classe”.
Veja os principais pontos:
- O projeto reduz a duração de inelegibilidade ao antecipar a contagem. Esse prazo continua sendo de oito anos, mas passaria a ser contado a partir do momento da condenação e não depois do cumprimento da pena.
- A iniciativa também estabelece um teto de 12 anos para o período de inelegibilidade.
- A iniciativa ainda determina que é preciso comprovar o dolo quando o político comete atos de improbidade.
- O texto também amplia de quatro para seis meses o período de desincompatibilização de candidatos que são integrantes do Ministério Público, da Defensoria Pública, militares e policiais.
As mudanças têm o potencial de beneficiar o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, que é pai da deputada Dani Cunha (União-RJ), autora do projeto. Também seriam afetados os ex-governadores Anthony Garotinho (RJ) e José Roberto Arruda (DF).
Cunha disse que vai participar das eleições de 2026, mas negou que o projeto o beneficie. Arruda não comentou, mas interlocutores declararam que ele não pretende mais disputar eleições.
Rafael Faria, advogado de Garotinho, diz que “a mudança traz justiça para os novos marcos prescricionais, pois os réus que tiveram interesse recursal, ou seja, vontade de lutar por seus direitos, foram prejudicados por um maior prazo prescricional”.
No caso de Garotinho, ele é candidato a vereador nas eleições deste ano e já teve a elegibilidade de volta após decisão liminar do ministro do Supremo Tribunal Federal Cristiano Zanin.
A Associação Brasileira de Eleitoralistas, que tem entre seus membros o advogado Marlon Reis, um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa, divulgou nota em que avalia que o texto “atenta contra a soberania popular, contraria o interesse público e serve apenas para dar livre acesso à candidatura a cargos eletivos a indivíduos que deveriam estar fora do processo político”.
“A inelegibilidade por oito anos incidiria apenas após a condenação por órgão colegiado. Dessa forma, o projeto reduz drasticamente o prazo de inelegibilidade de condenados por crimes gravíssimos – como homicídios, estupros, tráfico de drogas, organização criminosa, entre outros crimes hediondos. Em alguns casos, indivíduos condenados por tais crimes nem mesmo ficariam inelegíveis, pois ao contar o prazo de 8 anos da condenação por órgão colegiado, e não do término da pena, esses indivíduos, ao término da pena, já teriam cumprido o prazo de inelegibilidade”, se queixa a associação.
Com informações de O Globo.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/senado-adia-para-depois-das-eleicoes-votacao-de-projeto-que-reduz-periodo-de-inelegibilidade-estabelecido-pela-lei-da-ficha-limpa/