
Diante da escalada de tensões entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional em torno da suspensão do decreto que aumentou o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) passaram a defender uma saída negociada para a crise.
A articulação, segundo reportagem exclusiva da Folha, deve ser liderada por Alexandre de Moraes, relator da ação movida pela AGU (Advocacia-Geral da União), que pede a confirmação da constitucionalidade do decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a suspensão dos efeitos do decreto legislativo que o anulou.
A ofensiva judicial foi autorizada por Lula após o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), colocar em votação, sem aviso prévio ao governo, o projeto que derrubava o decreto. O gesto, que teria sido visto por Lula como uma “traição”, acirrou a crise entre os Poderes. Motta, por sua vez, negou deslealdade e acusou o Executivo de fomentar a polarização social.
A ação da AGU foi protocolada nesta terça-feira (1º), com base no argumento de que o Congresso extrapolou suas atribuições ao sustar um ato do Executivo que tratava de política fiscal — competência exclusiva do presidente da República. Além da liminar, o governo pede que o Supremo reconheça, em definitivo, a validade do decreto.
Apesar de verem solidez jurídica nos argumentos da AGU, ministros do STF demonstram preocupação com os desdobramentos políticos da disputa. Um deles relatou desconforto com a constante transferência de embates políticos ao Judiciário e sugeriu que Lula “chame o feito à ordem” — termo jurídico que, nesse contexto, representa um gesto de recondução do processo ao diálogo político.
Na avaliação dos magistrados, há precedentes favoráveis ao governo, como decisões da Corte que impediram Assembleias Legislativas de derrubarem decretos estaduais, em linha com o artigo 49 da Constituição, que limita o poder do Legislativo de sustar atos do Executivo apenas em casos de abuso. Ainda assim, há temor de que um novo embate entre STF e Congresso aprofunde o desgaste institucional.
Com o objetivo de baixar a temperatura, aliados de Lula e parlamentares próximos à cúpula do Congresso têm defendido uma saída conciliada. Segundo interlocutores, há disposição mútua para o diálogo, mas ainda sem aval formal do presidente para recuar da ação no Supremo. Um auxiliar de Lula comparou a medida judicial a um “antitérmico”, para conter o agravamento da febre política e abrir caminho para um “tratamento” mais amplo.
Parte da negociação deverá ser feita informalmente no 13º Fórum de Lisboa, que começa nesta quarta-feira (2). O evento reunirá ministros do STF e do governo federal, como Jorge Messias (AGU), Alexandre de Moraes (STF) e Flávio Dino (Justiça), e é tradicionalmente promovido por Gilmar Mendes — daí o apelido “Gilmarpalooza”.
Durante o encontro, espera-se que Moraes e Messias aprofundem as conversas sobre os rumos do caso. Messias reiterou que o decreto presidencial é plenamente constitucional e não poderia ter sido derrubado por um PDL (Projeto de Decreto Legislativo). “A medida adotada pelo Congresso acabou por violar o princípio da separação de Poderes”, afirmou o advogado-geral.
A decisão de acionar o STF foi tomada em reunião com Lula, Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) e Jorge Messias. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também se manifestou a favor da judicialização em entrevista recente, reforçando o apoio do governo à medida.
Ainda que uma ala do governo defendesse uma solução política antes mesmo da votação do Congresso, a falta de coordenação entre Executivo e Legislativo levou o Planalto a judicializar o tema. Agora, a expectativa gira em torno da capacidade de Moraes de conduzir um acordo que preserve as prerrogativas do governo sem agravar a crise institucional.
Enquanto isso, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), tentou minimizar o impasse: “O governo tem legitimidade de tomar qualquer decisão, simples assim”, disse. Sobre a possibilidade de vitória do governo no Supremo, completou: “Deixa acontecer”.
A solução para a crise do IOF — seja judicial ou política — poderá ter efeitos duradouros sobre a relação entre os Poderes e será um novo teste para a articulação institucional do governo Lula no segundo semestre.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/stf-entra-em-campo-com-moraes-e-tenta-conciliar-governo-e-congresso-na-crise-sobre-o-iof/