
Mais da metade dos alunos da rede pública do Rio estudam em áreas dominadas por grupos armados, segundo dados apresentados pelo Unicef em audiência pública da Comissão de Servidores Públicos da Assembleia Legislativa (Alerj), nesta quinta-feira (25).
O levantamento mostra que cerca de 55% dos estudantes convivem diariamente com a violência, realidade que afeta diretamente 1,8 mil escolas e mais de 800 mil alunos.
O cenário, considerado alarmante pelos especialistas, levou o colegiado a anunciar a criação de um Grupo de Trabalho (GT). A missão será elaborar um relatório com análises detalhadas e propor alterações na legislação para enfrentar os impactos da violência sobre a comunidade escolar.
Números da violência
Segundo o Unicef, 20% do território fluminense está sob controle de grupos armados. Em 2022, foram registrados 4.400 tiroteios nas proximidades de escolas, o que contribuiu para que estudantes dessas áreas acumulassem até seis meses de atraso em relação aos colegas que vivem em regiões sem domínio armado.
A representante da entidade, Flávia Antunes, destacou que a violência cotidiana anula avanços sociais e amplia desigualdades.
“Nenhuma criança ou adolescente deveria viver sob o som de tiros, com medo de ir à escola ou de brincar na rua. A situação é grave, mas não é inevitável. Os números que apresentamos não são só uma denúncia, são um chamado para diálogo baseado em evidências e propostas concretas”, afirmou.
Ela lembrou ainda que, em maio deste ano, o Comitê de Direitos da Criança da ONU expressou preocupação com a violência sistemática contra crianças no Brasil, especialmente negros e pobres, e recomendou medidas de grande escala para enfrentar o problema.
Escola como espaço de proteção
O deputado Flávio Serafini (PSOL), presidente da Comissão de Servidores Públicos, ressaltou que o tema ultrapassa o campo educacional.
“As políticas educacionais e o ambiente escolar são centrais para garantir o direito à educação, à vida e à cidadania das nossas crianças e adolescentes. É fundamental que essas discussões gerem compromissos concretos do poder público, envolvendo não só a educação, mas também saúde, segurança e assistência social”, afirmou.
Na mesma linha, a coordenadora do projeto Estratégias Intersetoriais de Produção do Cuidado em Escolas, Ingrid D’ávilla, defendeu a escola como lugar de cuidado e saúde.
“Sempre retomamos esse debate quando vivenciamos chacinas e tragédias em escolas, que infelizmente têm sido cada vez mais presentes. Isso reforça a emergência de pensar a escola como espaço de proteção, como deveria ser desde suas origens”, disse.
Políticas públicas insuficientes
A técnica em assuntos educacionais da UFRJ, Andréia Martins, afirmou que a atual política de segurança não responde às necessidades da comunidade escolar.
“Essa violência é resultado de uma política que não tem eficácia e causa danos colaterais significativos. Crianças têm medo de ir à escola, famílias não se sentem seguras para deixá-las, e trabalhadores informais perdem dias de renda”, afirmou.
Ela citou experiências como o Projeto Rainar, na Maré, e o Programa Saúde na Escola (PSE), que buscam contornar a situação, mas ainda enfrentam limitações estruturais.
Também participaram da audiência a defensora pública Maria Júlia Miranda, a pesquisadora da Fiocruz Mayalu Matos e a representante do Sepe-RJ, Ivanete Silva.
O Grupo de Trabalho criado pela Alerj deve iniciar seus trabalhos ainda este ano, com expectativa de apresentar um relatório que ajude a definir estratégias concretas de enfrentamento à violência nas escolas.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/violencia-atinge-800-mil-estudantes-e-mais-de-mil-escolas-no-rio-aponta-unicef/