A corrida da inteligência artificial (IA) não deu trégua nem na reta final do ano. Na mesma semana, duas das maiores rivais do setor anunciaram lançamentos importantes e que prometem acirrar ainda mais a competição em 2025. Enquanto o Google lançou o modelo de geração de vídeos em 4K Veo 2, a OpenAI revelou o o3, um modelo focado na resolução de problemas complexos.
Os dois anúncios estão longe de serem os únicos do ano. Pelo contrário: ambas empresas investiram pesado em IA multimodal, de imagem e vídeo. A mensagem que ficou nos últimos dias de 2024 é simples: a disputa pela vanguarda da tecnologia continua. No entanto, os resultados atingem não apenas as big techs e desenvolvedoras, mas principalmente usuários ao redor do mundo.
O Olhar Digital relembra alguns dos principais lançamentos no campo de inteligência artificial em 2024 e o que isso significou, e discute com especialistas o que esperar para 2025.
2024: mais um ano da IA
Desde o lançamento do ChatGPT, no final de 2022, a inteligência artificial se popularizou cada vez mais. Agora, a tecnologia também tem se tornado mais acessível, com ferramentas de geração de texto, imagem e vídeos chegando gratuitamente ao público.
Vamos relembrar alguns dos principais lançamentos do ano.
O Google saiu na frente.
- Já em fevereiro, a big tech anunciou o Gemini 1.5, uma versão aprimorada do modelo já existente da empresa e que prometeu melhorias em eficiência, processamento e até na qualidade de consultas;
- No mesmo mês, o Google anunciou o Genie, modelo que pode transformar textos, esboços e ideias em mundos virtuais interativos para jogos;
- Em maio, foi a vez do AlphaFold 3, modelo voltado para biotecnologia que prevê forma e comportamento de proteínas, podendo revolucionar a indústria farmacêutica e de saúde;
- Já no segundo semestre, após atualizações do Gemini 1.5 e do Genie, foi a vez do Google anunciar o GenCast, modelo de IA que promete gerar previsões do tempo em períodos maiores e com rapidez;
- Parecia que o ano tinha acabado, mas não. Em dezembro, o Google lançou o modelo multimodal Gemini 2.0 Flash, o gerador de imagens Imagen 3 e o Veo 2, uma atualização do gerador de vídeos realistas Veo.
OpenAI
A OpenAI, grande pioneira da IA, não ficou para trás. A empresa lançou o GPT-4o e o GPT-4o Mini, atualizações importantes do modelo de linguagem que alimenta o ChatGPT.
Em dezembro, a desenvolvedora lançou outros dois modelos multimodais inéditos (que já tinham sido anunciados há alguns meses): o o1 e o o1 Pro. E demorou pouco para que anunciasse o próximo, ainda mais avançado: o o3 e o3 Mini.
No mesmo mês, a companhia liberou o Sora, gerador de vídeos capaz de produzir vídeos realistas e que promete acirrar ainda mais a corrida da IA.
Anthropic, Meta, xAI e mais empresas
Google e OpenAI podem até estar na frente na corrida da IA, mas não são as únicas disputando:
- A Anthropic, por exemplo, anunciou o lançamento de atualizações para seu modelo multimodal Claude – que, inclusive, foi disponibilizado no Brasil no segundo semestre;
- O xAI, empresa de IA de Elon Musk, também lançou seu próprio modelo de linguagem, o Grok 1.5 (que, em alguns meses, virou Grok 2 e foi disponibilizado ao público), e um gerador de imagens, o Aurora;
- A Meta começou o ano com o anúncio do Llama 3, que ganhou atualizações;
- A Apple também entrou no jogo e anunciou o Apple Intelligence, IA multimodal que chegou aos iPhones e outros produtos da empresa no segundo semestre;
- Antes, a Samsung já tinha apresetado a Galaxy AI, que turbinou as linhas mais avançadas da maca.
- A Amazon não ficou de fora e lançou vários modelos de IA de uma única vez, incluindo duas IAs multimodais, uma de linguagem, uma de imagem e uma de vídeo;
- Nomes como Midjourney (responsável pelo gerador de imagens homônimo), Black Forest (responsável pelo gerador de imagens Flux) e World Labs (desenvolvedora do gerador de ambientes 3D homônimo) também chamaram atenção durante 2024.
O que esses lançamentos significam?
Em linhas gerais, os lançamentos mostram que a IA continua avançando.
Roberto “Pena” Spinelli, físico pela USP, com especialidade em Machine Learning por Stanford e pesquisador na área de Inteligência Artificial, destacou ao Olhar Digital uma verdadeira corrida nos modelos de geração de vídeo, por exemplo.
A OpenAI saiu na frente com o anúncio do Sora, mas, na época, não chegou a lançá-lo. A resposta do setor foi “correr atrás” do prejuízo, o que, para Pena, tornou a área um dos grandes avanços dentro do setor de IA. No final de 2024, quem venceu sequer foi a OpenAI, mas sim o Veo 2, do Google (na opinião do especialista, claro).
Mas não só a geração de vídeos avançou. O pesquisador chamou atenção para novidades interessantes na área de geração de imagens, bem como em tarefas até então pouco investidas. Foi o caso do GenCast, que inseriu o Google no setor da meteorologia; do Genie, que pode criar ambientes 3D completos e mudar o desenvolvimento de jogos; e o AlphaFold 3, capaz de revolucionar a medicina e indústria farmacêutica.
Ao mesmo tempo, as desenvolvedoras e big techs seguiam atualizando seus modelos de linguagem e multimodais, sempre na busca por melhorar a eficiência e confiabilidade. Segundo Pena, “o grande destaque de 2024 foi a corrida, com cada empresa querendo ‘bater’ a outra”. E não vai parar tão cedo:
Estamos vivendo um momento único. Não é moda, como foi com a realidade virtual ou o metaverso. A IA é muito disruptiva e vai além da internet, do celular, do videogame… Tivemos apenas uma palinha com essa corrida. Estamos vivendo essa transformação.
Roberto “Pena” Spinelli
Riscos e dificuldades
A discussão sobre os riscos da tecnologia não passou, mas, para a professora da PUC-SP e pesquisadora de impactos éticos da inteligência artificial Dora Kaufman, os destaques do setor este ano foram referentes à regulamentação (o Olhar Digital preparou um conteúdo completo sobre o assunto aqui).
Kaufman lembrou do AI Act, que estava em debate desde 2021 e está caminhando parar virar lei na União Europeia. A legislação se tornou uma referência global para que outros países aproveitem os benefícios da tecnologia, mas se protegendo contra os riscos.
No Brasil, o projeto que regula o desenvolvimento da IA no país avançou no Senado e será votado na Câmara dos Deputados. Para ela, a intenção a nível global é justamente mitigar os riscos desses sistemas.
De acordo com Pena, os problemas da regulamentação envolvem a rapidez da IA. Isso porque, conforme as discussões estão acontecendo, os avanços já estão sendo anunciados e lançados ao público. No final das contas, as empresas preferem arcar com os riscos de serem processadas (por exemplo, nos casos de violação de direitos autorais) do que ficar para trás na corrida.
O que esperar da IA em 2025?
Os especialistas consultados destacam que uma das principais novidades esperadas para 2025 são os agentes autônomos. A tecnologia se refere a sistemas inteligentes capazes de realizar tarefas e tomar decisões de forma independente, ou seja, sem intervenção humana. Microsoft, OpenAI e outras empresas já têm planos nesse sentido para o próximo ano.
Para Pena, os agentes autônomos são apenas o início de uma caminhada que pode levar à inteligência artificial geral (o Olhar Digital explicou mais sobre essa tecnologia aqui).
2025 vai ser o ano dos agentes. As IAs, que hoje são mais assistentes, vão se tornar mais ativas, vão começar a agir. Terão controle do computador para fazer tarefas para você. Mas não só no uso pessoal, também no uso de empresas. Para mim, isso é a ponta do iceberg. Se não encontrarmos nenhum obstáculo, em pouco tempo vamos chegar na IA geral, uma IA que consegue fazer qualquer coisa que um humano consegue fazer, intelectualmente falando.
Roberto “Pena” Spinelli
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Já segundo Kaufman, o problema está nos próprios agentes autônomos. Isso porque não temos clareza de qual o estágio e qual o grau de avanço real dessa tecnologia, o que pode exagerar as capacidades desses sistemas e confundir pessoas. Basicamente, o que temos agora são anúncios de empresas, mas nenhuma demonstração real.
Isso leva a outra questão: as big techs e desenvolvedoras estão apostando nos agentes, mas deixando de lado a preocupação com as limitações (que ainda nem sabemos quais são). Consequentemente, o público se anima, sem saber o que esperar.
A competição acirrada pela liderança da inovação em IA, particularmente das soluções de IA generativa que têm atraído o maior volume de capital de risco, tem levado a indústria a negligenciar as evidências das limitações, dificultando distinguir o progresso genuíno do exagero. Na busca por cliques, a mídia acaba reverberando o hype proposital dos porta-vozes da indústria.
Dora Kaufman
Então, como nos protegermos?
A professora destaca principalmente a regulamentação do setor, uma que “capacite o Estado a proteger a sociedade dos potenciais danos, ao mesmo tempo que crie um ambiente favorável ao investimento, desenvolvimento e adoção da IA”. Ao mesmo tempo, ela afirma que cada empresa precisa ter suas diretrizes de segurança durante o desenvolvimento das tecnologias.
Já Pena acredita que os impactos serão transformadores, especialmente para a sociedade, e a preocupação precisa continuar. Ele chama atenção para duas questões:
- A primeira é a do trabalho. Profissões manuais, como cabeleireiros, jardineiros e garçons, serão difíceis de substituir. Já profissões mais intelectuais, que exigem pensamento crítico, por exemplo, podem estar ameaçadas pelos agentes – e ainda mais em risco com a IA geral. Isso leva a uma mudança de paradigma do trabalho. Afinal, o que fica para nós e o que fica para a tecnologia?
- A segunda questão é a da própria segurança da IA. Ele explica que a tecnologia precisa de um alinhamento com a humanidade, para garantir que ela tenha objetivos parecidos com os nossos e não faça algo de ruim ao seres humanos.
Segundo Pena, esses sistemas deveriam estar sendo treinados dentro de bunkers para garantir a nossa segurança, ao invés de serem lançados ao público.
Mas, calma. Assim como Kaufman, o pesquisador lembra que precisamos nos conscientizar com as preocupações acerca da segurança da IA. A percepção desses riscos pode ser difícil – ainda mais quando temos tantas novidades a cada semana -, mas é algo necessário para caminharmos para um futuro saudável.
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