
Uma “cicatriz” na superfície de Plutão, até então interpretada como uma cratera de impacto, pode ser outra coisa: a caldeira de um supervulcão que explodiu em algum momento dos últimos milhões de anos. É o que sugere um estudo apresentado na conferência Progress in Understanding the Pluto System: 10 Years After Flyby, que aconteceu no mês passado em Laurel, Maryland, EUA.
Em resumo:
- Uma estrutura em Plutão, antes considerada cratera, pode ser caldeira vulcânica;
- Cientistas analisaram imagens da sonda New Horizons e notaram sinais de criovulcanismo;
- A depressão Kiladze é mais profunda que o esperado para crateras formadas por impacto;
- Pesquisadores sugerem que ela entrou em colapso após uma supererupção de criomagma;
- Gelo de água e traços de amônia indicam erupção recente, talvez há três milhões de anos;
- Se confirmada, a descoberta mostra que Plutão pode ainda ser geologicamente ativo.
Em 2015, a sonda New Horizons, da NASA, fez um sobrevoo histórico por Plutão. O planeta anão surpreendeu os cientistas com uma superfície complexa, cheia de montanhas, planícies e sinais de atividade geológica. Entre as formações identificadas, estavam os Montes Wright e Piccard, apontados como possíveis vulcões de gelo.
Pouco tempo depois, esses criovulcões foram confirmados por estudos complementares. Eles funcionam como os vulcões da Terra, mas em vez de lava quente, expelem uma mistura de água, gelo e outros compostos. No entanto, nem todos os sinais de vulcanismo são fáceis de identificar. Um exemplo é a região conhecida como Kiladze.
Kiladze é diferente de outras crateras em Plutão
Classificada inicialmente como uma cratera de impacto, formada por uma colisão com outro corpo celeste (possivelmente um asteroide), Kiladze teria outra origem, de acordo com uma pesquisa conduzida por Al Emran, cientista planetário do Laboratório de Propulsão a Jato (JPL), da NASA. Segundo ele, essa formação pode ser, na verdade, uma caldeira de supervulcão.
Caldeiras são depressões formadas após grandes erupções, quando o solo afunda por falta de sustentação. Emran comparou Kiladze à caldeira de Yellowstone, na Terra, que já sofreu explosões gigantescas. A suspeita surgiu por causa do formato e da profundidade incomuns da estrutura.
Kiladze tem cerca de quatro quilômetros de diâmetro, com forma oval e bordas irregulares. Isso poderia indicar uma cratera antiga, erodida com o tempo. Mas sua profundidade chamou atenção da equipe de Emran. Segundo o estudo, crateras desse tamanho em Plutão costumam ter no máximo 2,7 km de profundidade, enquanto Kiladze tem quase três quilômetros.
Se fosse mesmo uma cratera de impacto, deveria ser mais rasa por causa do acúmulo de gelo ao longo do tempo. Em vez disso, ela é mais funda do que o previsto. Para Emran e sua equipe, isso indica que Kiladze tenha origem vulcânica e não por colisão.

A hipótese é que essa depressão tenha sido um supervulcão que entrou em colapso após liberar uma enorme quantidade de criomagma. Os cálculos apontam que a erupção pode ter expelido até mil quilômetros cúbicos de material gelado, um volume suficiente para ser considerada uma supererupção.
Essa liberação pode ter ocorrido em um único evento ou em várias explosões ao longo do tempo. Em qualquer cenário, o criomagma teria se espalhado por pelo menos 100 km. É possível que tenha ido ainda mais longe, mas a resolução das imagens da sonda New Horizons limita a detecção de traços mais distantes.
Depressão é próxima do “coração” do planeta anão
Kiladze fica ao norte da Sputnik Planitia, a famosa planície em formato de coração coberta de gelo. A região ao redor da estrutura tem grande concentração de gelo de água, o que é raro em Plutão. Normalmente, a superfície do planeta anão é dominada por outros tipos de gelo, como o de nitrogênio.
Além disso, o gelo próximo a Kiladze contém traços de uma substância amoniacal desconhecida. “É difícil determinar a composição exata”, disse Emran durante a apresentação, segundo o site Space.com. De acordo com o pesquisador, esse composto não aparece em nenhum outro lugar de Plutão.

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A amônia é responsável por reduzir o ponto de congelamento da água, permitindo que o criomagma continue fluido por mais tempo. Sendo assim, bolsões subterrâneos de água misturada com amônia podem ter resistido ao congelamento. Com o tempo, a pressão interna pode ter empurrado esse material para a superfície, provocando uma erupção explosiva, o que explicaria a grande quantidade de gelo espalhado ao redor de Kiladze.
A presença de amônia também serve como pista para calcular a idade da erupção. Como esse composto se degrada rapidamente quando exposto ao espaço, sua presença indica que o evento vulcânico pode ter ocorrido há menos de três milhões de anos. Em proporções astronômicas, isso é considerado bem recente.
Outro detalhe que aponta para esse período é a fina neblina que cobre Plutão, que é formada por partículas que caem lentamente do céu e acabam escondendo sinais de atividade antiga. Para cobrir totalmente o gelo de uma caldeira como Kiladze, seriam necessários pelo menos três milhões de anos.
Como o gelo de água ainda está visível, é provável que a erupção tenha acontecido depois disso, o que significa que Plutão pode ainda estar geologicamente ativo. A descoberta reforça a ideia de que o interior do planeta anão retém calor suficiente para provocar criovulcanismo mesmo atualmente.
Segundo Emran, se essa atividade tiver ocorrido tão recentemente, é possível que outras erupções ainda estejam acontecendo. Isso mudaria a visão que se tinha de Plutão como um mundo frio e inativo, revelando que ele pode ser muito mais dinâmico do que se pensava.
O post “Cicatriz” em Plutão não é o que parecia ser, diz cientista da NASA apareceu primeiro em Olhar Digital.
Fonte: https://olhardigital.com.br/2025/08/06/ciencia-e-espaco/cicatriz-em-plutao-nao-e-o-que-parecia-ser-diz-cientista-da-nasa/