25 de fevereiro de 2025
Expansão acelerada do Universo: um dos maiores mistérios da ciência
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Nas últimas colunas, exploramos como medimos distâncias no Universo, desde a paralaxe estelar até as variáveis cefeidas estudadas por Henrietta Leavitt e o brilho das supernovas Ia desvendado por Cinkhandrasekhar. Vimos como, há 100 anos, Edwin Hubble descobriu que a maioria das galáxias está se afastando de nós – e que, quanto mais distante a galáxia, maior sua velocidade de afastamento. Isso nos levou à conclusão de que o Universo está em expansão e teve origem em uma grande explosão. Mas, nos anos 1990, os astrônomos fizeram uma descoberta inesperada, algo que desafia nossa compreensão do Cosmos até hoje: a expansão do Universo não apenas ocorre, mas ocorre de forma acelerada.

Mas como a ciência chegou a esta conclusão? E o que pode estar fazendo o Universo crescer cada vez mais rápido? Para entender isso, precisamos voltar à base das medições que revelaram a expansão do cosmos.

Edwin Hubble chegou à conclusão de que o Universo está se expandindo ao medir a distância e a velocidade de afastamento de diversas galáxias. As velocidades foram determinadas pelo desvio para o vermelho das linhas espectrais, enquanto as distâncias foram calculadas a partir do brilho de variáveis cefeidas observadas nessas galáxias. A relação entre distância e velocidade era tão evidente que podia ser expressa por uma fórmula matemática simples: a velocidade de afastamento de uma galáxia é proporcional à sua distância, com um fator de proporcionalidade chamado de Constante de Hubble. Essa constante representa a própria taxa de expansão do Universo.

[ Gráfico ilustrando a “Lei de Hubble” e sua constante (H, também representada por H0) – Imagem: Reprodução AstroPT ]

Desde essa descoberta, astrônomos vêm refinando suas medições para obter um valor mais preciso da Constante de Hubble e compreender melhor a evolução cósmica. No entanto, havia um problema: o método das cefeidas só funciona bem para galáxias próximas, onde conseguimos distinguir o brilho individual dessas estrelas variáveis. Além disso, algumas dessas galáxias sofrem influência gravitacional do Grupo Local, o que pode afetar as medições. Mas o maior desafio era que, ao observar apenas galáxias próximas, nossa visão ficava limitada tanto no espaço quanto no tempo.

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Afinal, a luz tem uma velocidade finita. Isso significa que, quanto mais distante um objeto está, mais tempo sua luz demora para chegar até nós. Ou seja, olhar para longe no espaço é olhar para trás no tempo. E foi quando passamos a utilizar as supernovas Ia como ‘réguas cósmicas’ para medir distâncias em escalas muito maiores, que a grande surpresa se revelou.

Até a década de 1990, acreditava-se que a expansão do Universo estivesse desacelerando. Essa era a conclusão mais lógica, já que a gravidade de toda a matéria deveria atuar como uma força de contração, resistindo à expansão. Se isso fosse verdade, a taxa de expansão deveria ser maior no passado, algo que poderíamos comprovar medindo a Constante de Hubble em galáxias muito distantes  e, consequentemente, mais antigas.

[ Hubble eXtreme Deep Field (XDF) – Milhares de galáxias em um campo de visão muito estreito. Quanto mais afastada a galáxia, mais avermelhada ela aparece – Créditos: NASA / ESA ]

Porém, em 1998, duas equipes independentes usaram supernovas Ia para medir a taxa de expansão do Universo em galáxias distantes. E ambas chegaram ao mesmo resultado surpreendente: em vez de uma Constante de Hubble maior no passado, os dados indicavam exatamente o oposto. No passado, o Universo se expandia mais devagar — e isso significa que essa expansão está acelerando! 

Essa descoberta rendeu o Prêmio Nobel de Física de 2011 a Saul Perlmutter, Brian Schmidt e Adam Riess e causou uma revolução na cosmologia. Se a gravidade deveria frear a expansão do Universo, o que estaria impulsionando essa aceleração? Até hoje, não temos uma resposta definitiva. Mas os cientistas deram um nome a essa força misteriosa: ‘energia escura’. Trata-se de uma forma de energia de natureza desconhecida, que permeia todo o espaço e age em oposição à gravidade, impulsionando a expansão acelerada do Universo.

A ideia de uma energia que preenche o espaço, no entanto, não é nova. O próprio Einstein, ao formular a Teoria da Relatividade Geral, introduziu a ‘constante cosmológica’, um termo matemático que representava uma força repulsiva capaz de equilibrar a gravidade e manter o Universo estático. Mas, quando Hubble descobriu a expansão do Universo, Einstein descartou essa ideia, chamando-a de seu ‘maior erro’. Ironia do destino, décadas depois, a constante cosmológica ressurgiu como uma forte candidata a explicar a energia escura!

Mas a energia escura não impacta apenas nosso entendimento do presente. Se a expansão do Universo nos ajuda a compreender suas origens, ela também nos dá pistas sobre seu destino. O futuro do cosmos depende do delicado equilíbrio entre a energia escura e a gravidade. Se, em algum momento, a gravidade prevalecer, o Universo poderá colapsar em um Big Crunch, um ‘Big Bang às avessas’. Se a energia escura for dominante, a expansão poderá se tornar tão intensa que o próprio tecido do espaço-tempo se fragmentaria em um cenário extremo chamado ‘Big Rip’. Mas se a energia escura e a gravidade se mantiverem em equilíbrio, o Universo se tornará cada vez mais frio, escuro e vazio, com as galáxias se afastando até se tornarem ilhas isoladas num oceano cósmico infinito.

[ Destino do Universo em função do equilíbrio entre gravidade e energia escura – Imagem: NASA ]

Para determinar qual desses destinos nos aguarda — e para entender melhor a história da evolução do nosso Universo — precisamos decifrar a natureza da energia escura, que permanece um dos maiores enigmas da ciência. Para isso, os astrônomos estão desenvolvendo instrumentos de última geração, como o radiotelescópio BINGO, o Telescópio Espacial Euclides e o Nancy Grace Roman, que mapearão a distribuição da energia escura em diferentes eras da evolução cósmica. Talvez, com esses novos olhos voltados para o Universo, possamos finalmente revelar um dos grandes mistérios da física moderna.

Sem dúvida, a energia escura é um dos mais desafiadores enigmas da cosmologia moderna e, ao mesmo tempo, uma das maiores oportunidades para a ciência. Assim como Leavitt revelou a régua cósmica das cefeidas, Hubble desvendou a expansão do Universo e Chandrasekhar estabeleceu fundamentos essenciais para a medição de grandes distâncias cósmicas, estamos agora diante de mais um momento decisivo na história do nosso conhecimento do Cosmos. 

Desvendar os mistérios da energia escura poderá não apenas revolucionar nossa compreensão sobre o Universo, suas origens e seu destino, mas também transformar as próprias fundações da física. Isso poderá ser a ponte para novas teorias que unifiquem a relatividade geral e a mecânica quântica, e talvez até revelar aspectos desconhecidos do espaço-tempo. Esse não é o capítulo final dessa história, mas certamente é um dos mais intrigantes. E as descobertas que estão por vir podem redefinir, mais uma vez, a nossa visão do Universo e do nosso lugar nesta imensa arena cósmica. 

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Fonte: https://olhardigital.com.br/2025/02/25/colunistas/expansao-acelerada-do-universo-um-dos-maiores-misterios-da-ciencia/