15 de junho de 2025
Golpes e fraudes digitais: o prejuízo além do óbvio
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Nos bastidores do sistema financeiro brasileiro, uma crise silenciosa vem se agravando: a corrosão da confiança nas ações de cobrança.

Se por um lado a transformação digital trouxe agilidade, escala e personalização às interações entre empresas e consumidores inadimplentes, por outro ela também abriu portas para fraudes cada vez mais sofisticadas e perigosamente parecidas com as comunicações legítimas.

O resultado é um cenário onde o medo e a desconfiança contaminam até mesmo os processos éticos e regulados, afetando diretamente a capacidade de recuperação de crédito no país.

De acordo com a Serasa Experian, o Brasil registrou 11.509.214 tentativas de fraudes, um aumento de 9,4% em relação ao ano anterior.

O setor financeiro é o mais afetado, representando quase metade dos ataques e, dentro dele, a cadeia de cobrança é um dos alvos mais estratégicos para os criminosos. Eles se aproveitam da vulnerabilidade emocional de quem já está em situação de inadimplência e da urgência natural envolvida nesse tipo de contato.

Quando o golpe parece verdadeiro demais

É exatamente essa urgência que os golpistas mimetizam com perfeição. Eles clonam identidades visuais, simulam linguagens institucionais, criam centrais de atendimento falsas e, por vezes, conseguem dados tão precisos sobre a vida financeira da vítima que seus contatos se tornam quase indistinguíveis de uma cobrança legítima.

Essa engenharia social, combinada com a velocidade das redes digitais, torna os ataques não apenas mais eficazes, mas também mais destrutivos.

Golpes digitais imitam com perfeição a urgência e aparência de cobranças reais (Imagem: Kim Kuperkova/Shutterstock)

Um levantamento da FEBRABAN revelou que, em 2023, um em cada quatro boletos pagos fora de canais oficiais era fraudulento.

A situação é ainda mais crítica quando se considera que muitos desses pagamentos partem de pessoas que, apesar das dificuldades financeiras, estão tentando quitar dívidas. Em vez de sair da inadimplência, elas acabam sendo duplamente penalizadas: continuam com o nome negativado e ainda perdem recursos importantes para golpistas.

O maior prejuízo, no entanto, não é apenas individual, é sistêmico. A sucessão de fraudes tem minado a confiança dos consumidores em todo o ecossistema de cobrança.

Muitos deixam de abrir e-mails, ignoram mensagens SMS, desconfiam de ligações e evitam negociar débitos mesmo quando desejam fazê-lo, simplesmente por medo de cair em mais um golpe.

É preciso ter atenção às fraudes digitais (Imagem: Pixel-Shot/Shutterstock)

Essa retração tem efeito cascata: quanto menor a taxa de efetividade das ações de cobrança, mais cara se torna a operação de recuperação de crédito. As empresas precisam investir mais em segurança da informação, autenticação em múltiplos fatores, canais verificados e treinamento contínuo. A tecnologia se torna tanto escudo quanto espada e o custo de manter essa infraestrutura não é pequeno.

Mais grave ainda: a dificuldade em recuperar crédito impacta diretamente os modelos de concessão. Bancos, financeiras e empresas de diversos setores passam a recalibrar seus algoritmos de risco e suas condições de parcelamento, o que, na prática, restringe o acesso ao crédito para milhões de brasileiros. Em outras palavras, os golpes não apenas desviam dinheiro, mas geram uma externalidade tóxica que corrói um dos pilares da economia nacional: o consumo financiado.

Reinventar a cobrança, reconstruir o vínculo

Diante desse cenário, é inevitável reconhecer que a cobrança, tal como conhecíamos, precisa ser reinventada. Mais do que uma operação financeira, ela precisa se posicionar como um canal de reconstrução de vínculo e segurança. A personalização dos contatos, respeitando não só a dívida, mas o momento de vida do consumidor é fundamental.

Cobrança eficaz começa com empatia: entender o momento de vida do consumidor é essencial (Imagem: LightField Studios/Shutterstock)

Do lado do consumidor, a educação digital precisa ser amplificada. Saber identificar um canal oficial, desconfiar de pressão para pagamento imediato, verificar a procedência de boletos e evitar clicar em links suspeitos são práticas que precisam ser disseminadas com a mesma força que campanhas de marketing. Afinal, um consumidor bem informado não apenas evita golpes, ele também é mais propenso a negociar com empresas confiáveis.

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Algumas dicas podem tornar mais segura a jornada do consumidor, como sempre consultar o site da Anatel, onde é possível saber se a ligação veio de empresa homologada por àquela instituição. Além disso, é imprescindível conferir o nome do credor no boleto emitido e desconfiar se for de terceiros ou de empresa que não é a que possui pendência. Outro ponto importante é ter atenção ao nome do site consultado. O simples fato de conferir se o site acessado é realmente das empresas homologadas pelas instituições financeiras já aumentará a segurança do consumidor.

Educação digital é a primeira defesa contra fraudes (Imagem: tete_escape/Shutterstock)

No fim, trata-se de uma disputa por confiança. De um lado, empresas sérias que precisam reaver valores para manter seu fluxo de caixa. Do outro, criminosos que transformaram a cobrança em terreno fértil para fraude. No meio, um consumidor vulnerável e cada vez mais cético. A saída exige tecnologia, sim, mas exige, acima de tudo, ética, empatia e a consciência de que a confiança não é um dado: é um processo, construído todos os dias.

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Fonte: https://olhardigital.com.br/2025/06/15/colunistas/golpes-e-fraudes-digitais-o-prejuizo-alem-do-obvio/