22 de novembro de 2025
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Um artigo publicado neste sábado (22) na Nature Communications descreve uma vacina oral que usa bactérias probióticas para estimular o sistema imunológico a combater tumores. O método combina microrganismos geneticamente modificados com nanopartículas de ferritina que exibem dois antígenos tumorais, e já apresentou resultados positivos em modelos pré-clínicos de melanoma.

A estratégia é engenhosa: a bactéria probiótica é programada para se “autodestruir” dentro do intestino quando estimulada por arabinose, liberando partículas de ferritina cheias de antígenos. Essas nanopartículas conseguem atravessar a barreira intestinal por meio de células especiais chamadas M-cells, alcançando células do sistema imune local.

Ao chegar lá, elas ativam células dendríticas mucosas, que iniciam uma reação imune forte e bem direcionada — com participação de células T (CD8+ e CD4+), células B e macrófagos. Além disso, o sistema gera memória imunológica, o que sugere proteção a longo prazo, tudo isso sem desequilibrar a imunidade normal do organismo ou do intestino.

Estudo identifica sinal que desliga células T e mostra como reativar o sistema imune no combate ao câncer
Novo procedimento direciona as defesas do próprio indivíduo contra o câncer (Imagem: Lightspring / Shutterstock.com)

Como a nova vacina oral contra o câncer funciona?

A vacina usa uma bactéria probiótica modificada para produzir nanopartículas de ferritina decoradas com dois antígenos tumorais: OVA (um antígeno modelo) e TRP2 (associado ao melanoma). Essas nanopartículas são organizadas de forma multivalente, o que significa que muitos antígenos ficam expostos em uma só partícula — isso ajuda o sistema imune a reconhecê-los melhor.

Quando o probiótico chega ao intestino, a arabinose induz sua lise (ruptura), liberando as partículas. Então, as nanopartículas usam células M para cruzar para o interior do tecido imunológico intestinal, onde são captadas por células dendríticas que iniciam a resposta adaptativa.

Resultados obtidos em modelos animais

Nos experimentos com camundongos portando melanoma, os pesquisadores observaram:

  • Ativação forte de linfócitos T CD8+ e CD4+, células cruciais para atacar células tumorais.
  • Estímulo de células B e macrófagos, reforçando a resposta imunológica de forma mais ampla.
  • Diminuição de células T reguladoras (Tregs), que normalmente poderiam frear a resposta imune — algo positivo para efeitos antitumorais.
  • Indução de memória imunológica duradoura, indicando que o sistema pode “lembrar” dos antígenos e manter a proteção.
  • Em modelos de melanoma com metástase pulmonar ou tumores subcutâneos, os animais vacinados tiveram redução no crescimento tumoral.
  • Tudo isso foi conseguido sem provocar desequilíbrios imunológicos no organismo ou no intestino, segundo os autores.
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Testes foram feitos em camundongos portando melanoma, que reagiram positivamente ao tratamento (Imagem: Egoreichenkov Evgenii / Shutterstock.com)

Vantagens da abordagem para humanos

A vacina oral traz diversas vantagens: por ser administrada via bucal, dispensa agulhas. A lise bacteriana controlada permite que os antígenos sejam liberados exatamente onde são mais eficazes — no intestino.

A estrutura multivalente das nanopartículas de ferritina reforça a apresentação de antígenos, aumentando a potência imunogênica. Além disso, a indução de memória imunológica sugere que a vacina pode exercer efeitos terapêuticos duradouros.

Desafios para avançar para clínica

Apesar dos resultados promissores, a transição para uso clínico ainda enfrenta obstáculos. A lise bacteriana precisa ser muito bem calibrada para evitar inflamação ou efeitos adversos. Há ainda a necessidade de escalar a produção dessa cepa modificada e das nanopartículas com rigor de qualidade farmacêutica.

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Testes com humanos dependem de mais etapas, inclusive superar barreiras regulatórias (Imagem: mi_viri / Shutterstock.com)

Também existe uma forte barreira regulatória: terapias baseadas em microrganismos vivos demandam avaliação complexa para serem aprovadas. Por fim, os modelos em camundongos nem sempre se traduzem diretamente para humanos, o que exige mais estudos antes de qualquer aplicação clínica.

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Importância científica

O trabalho se insere numa tendência promissora da biomedicina moderna: usar microrganismos vivos como “ferramentas terapêuticas” (às vezes chamados de “drogas vivas”). Essas terapias aproveitam a capacidade natural das bactérias de interagir com o sistema imunológico para entregar antígenos de forma controlada.

Usar nanopartículas de ferritina para organizar os antígenos de maneira multivalente é especialmente inteligente, porque aumenta a “visibilidade” desses antígenos para as células imunes, potencializando a resposta sem precisar de adjuvantes muito agressivos.

O post Nova vacina oral probiótica estimula sistema imune contra o câncer apareceu primeiro em Olhar Digital.

Fonte: https://olhardigital.com.br/2025/11/22/medicina-e-saude/nova-vacina-oral-probiotica-estimula-sistema-imune-contra-o-cancer/