
Neurotecnologia refere-se às diferentes tecnologias voltadas para entender, visualizar, controlar, reparar ou melhorar as funções do cérebro. Elas podem ser desde uma tradicional ressonância magnéticas até tecnologias mais avançadas, como a que permite comunicação direta entre o cérebro e os mais diferentes dispositivos externos, como já tratamos aqui no Olhar Digital.
Essas tecnologias facilitam o desenvolvimento de novos medicamentos, o uso técnicas de estimulação cerebral para o tratamento de condições neurológicas e psiquiátricas e ajudar as empresas a entender e responder às emoções humanas.
Ou seja, a neurotecnologia tem um grande potencial de transformar a medicina, marketing e diversas outras áreas do conhecimento, mas também leva a questões éticas que precisam ser debatidas, como privacidade mental, livre arbítrio e o uso responsável das tecnologias.
Uso ético da neurotecnologia precisa ser discutido
O ponto central do uso da neurotecnologia é como ela pode ser explorada sem prejudicar as pessoas. Enquanto ela pode transformar a vida de milhões de pacientes e consumidores, ela também abre uma grande estrada para que dados ainda mais pessoais, como pensamentos, humor e memórias sejam utilizados de forma não ética, explica artigo publicado no site Tech Xplore.
Dados neurais revelam estados mentais, cognitivos e emocionais, permitindo acesso a pensamentos, experiências e memórias, impactando em emoções, percepções e intenções. Assim, empresas que tiverem acesso a essas informações podem influenciar decisões e comportamentos, influenciando os próprios dados neurais.
Em um mundo em que boa parte da população sofrerá algum tipo de distúrbio neurológico, os avanços da neurotecnologia são fundamentais para entender como funciona o cérebro humano, mas, quando o foco vai além da medicina, é preciso tomar muito cuidado.
Vivemos em um mundo onde nosso cérebro é o ativo mais importante – ele sustenta os modelos de negócios baseados em dados de operadoras de mídia social e varejistas online. Essas empresas querem saber tudo sobre nossas preferências psicológicas para que possam influenciar decisões de compra, explorar nossas vulnerabilidades e nos manter reféns.
Marcello Ienca, filósofo e especialista em neuroética da Universidade Técnica de Munique, em entrevista ao Tech Xplorer.
Tratamentos médicos ainda são o foco da neurotecnologia, mas isso está mudando
Enquanto muitas empresas e neurocientistas trabalham juntos para desenvolverem métodos para o tratamento de depressão, paraplegia e doença de Parkinson, muitos projetos têm um viés diferente. A Neuralink, por exemplo.

A empresa de Elon Musk pretende implantar milhões de chips cerebrais nos próximos anos para fins não médicos, visando apenas melhorar o desempenho das pessoas.
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A ideia de que a Neuralink possa convencer um número significativo de pessoas a compartilhar seus dados neurais é preocupante. Se a empresa cometer um deslize – se um paciente morrer ou houver um grande vazamento de dados – isso minará a confiança na neurotecnologia e na comunidade cientifica como um todo.
Marcello Ienca, filósofo e especialista em neuroética da Universidade Técnica de Munique, em entrevista ao Tech Xplorer.
Pelo menos por enquanto, o que prevalece é o uso de neurotecnologias não invasivas, como o uso de mini-eletroencefalogramas integrados em fones de ouvido, pulseiras inteligentes e monitores do sono para controlar a atividade cerebral. Com isso, as empresas conseguem coletar um grande conjunto de dados para treinar algoritmos com maior eficiência e tornar tratamentos médicos mais eficazes.
Conhecer as preferências dos consumidores
No entanto, é inegável que as empresas pensem em aplicar a neurotecnologia com outros propósitos, coletando informações sobre preferências, intenções e desejos dos clientes diretamente em uma fonte importantíssima: seu cérebro para:
- Analisar de emoções, desejos e intenções
- Entender preferências e personalizar experiências
- Influenciar decisões de compras
- Desenvolver produtos que atendam às suas necessidades
- Adaptar estratégias de mercado

Há uma chance real de que nossa privacidade mental esteja em jogo, com o risco de que a tecnologia seja usada para manipular e explorar os consumidores. A neurotecnologia se tornará pessoal, e a usaremos não porque seja útil, mas porque alguém nos convenceu de que ela é útil.
Marcello Ienca, filósofo e especialista em neuroética da Universidade Técnica de Munique, em entrevista ao Tech Xplorer.
Ienca explica que trabalha junto a outros pesquisadores para criar regulamentações sobre o uso da neurotecnologia, mas que vise prejudicar a inovação. Segundo ele, é necessário atualizar a Declaração Universal de Direitos Humanos para que pensamentos e processos mentais também sejam considerados um direito humano fundamental.
Um primeiro passo já foi dado, com a elaboração de diretrizes para que os dados neurais sejam incluídos à Convenção 108 do Conselho Europa que trata da proteção de dados. Além disso, um grupo de trabalho da UNESCO elaborou recomendações sobre ética da neurotecnologia. O documento está, atualmente, sendo revisado pelos estados-membros da entidade.
Governos locais, como os estados do Colorado e da California, nos Estados Unidos, também adotaram leis que protegem dados neurais, colocando-os ao lado de diversos dados pessoais, como DNA e dados biométricos.
Essas ações são importantes regulamentar o uso desses dados, evitando a formação de monopólios e criando regras democráticas para que a neurotecnologia continue se desenvolvendo de forma ética.
O post Privacidade mental em risco: neurotecnologias podem ser uma ameaça apareceu primeiro em Olhar Digital.
Fonte: https://olhardigital.com.br/2025/08/09/medicina-e-saude/privacidade-mental-em-risco-neurotecnologias-podem-ser-uma-ameaca/