
A chamada “pejotização”, termo utilizado para definir a contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas (PJs) em vez de com carteira assinada, voltou ao centro do debate jurídico e trabalhista no Brasil. Em entrevista à Agência Brasil, o procurador Renan Kalil, titular da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho do Ministério Público do Trabalho (MPT), foi categórico ao afirmar que essa prática configura uma fraude.
“Ela ocorre quando alguém quer contratar um trabalhador, ou seja, que precisa de alguém que trabalhe com subordinação, que cumpra um horário, que vai receber um salário fixo, enfim, que preencha os requisitos da relação de emprego, mas ele [o empregador] opta por contratar essa pessoa como pessoa jurídica, como forma de fraudar a legislação trabalhista, de mascarar a relação de emprego”, declarou o procurador.
Segundo Kalil, para que a contratação de um prestador de serviços como PJ seja legítima, três requisitos precisam ser atendidos: a transferência real da atividade contratada, autonomia da empresa contratada e capacidade econômica para desenvolver o trabalho. Na maioria dos casos classificados como “pejotização”, essas condições não são observadas.
“Isso não quer dizer que não possa haver uma contratação de pessoa jurídica, que a gente não possa ter um trabalho autônomo que seja realizado de forma autêntica”, explicou Kalil. “Quando temos um trabalho pejotizado, não encontramos nenhuma dessas três características. É por causa disso que a gente identifica que a lei não está sendo corretamente observada. O trabalhador pejotizado não tem direito trabalhista algum.”
A pejotização ganhou força após a reforma trabalhista de 2017, que passou a permitir a terceirização de atividades-fim das empresas. Desde então, cresceu o número de ações na Justiça do Trabalho movidas por profissionais que, embora formalmente registrados como PJ, alegam exercer funções com características típicas de vínculo empregatício.
De acordo com dados do Ministério Público do Trabalho, entre 2020 e março de 2025, foram ajuizadas aproximadamente 1,21 milhão de reclamações trabalhistas relacionadas à pejotização no país.
O tema ganhou ainda mais destaque no último mês, após o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes decidir suspender todos os processos em curso que tratam da pejotização de trabalhadores. A medida gerou forte reação da comunidade jurídica trabalhista.
Na quarta-feira (7), magistrados, procuradores e advogados realizaram manifestações em diversas cidades do país, como Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília. Os atos denunciaram a tentativa de esvaziar a competência da Justiça do Trabalho no julgamento de casos de fraudes nas relações laborais.
As manifestações também foram marcadas por críticas à concentração de decisões no Supremo que, segundo participantes dos protestos, ameaça a eficácia da legislação trabalhista e enfraquece a proteção aos direitos dos trabalhadores.
O julgamento definitivo sobre o tema pelo STF ainda não tem data marcada, mas as declarações de Kalil e as mobilizações recentes reforçam o embate institucional em torno do reconhecimento de vínculos empregatícios ocultos por contratos de pessoa jurídica.
Fonte: https://agendadopoder.com.br/procurador-do-mpt-diz-que-pejotizacao-e-forma-de-fraudar-legislacao-e-critica-tentativa-de-enfraquecer-justica-do-trabalho/